Shabat Teshuvah
O que é?
Também conhecido como o Shabat do Retorno ou do arrependimento é o Shabat que cai entre Rosh Hashanah e Yom Kippur. O nome é oriundo do primeiro verso do texto da Haftará. Ele é chamado de Shabat do arrependimento por ser um dos dez dias entre Rosh Hashanah e Yom Kippur.
Não é significativo que Shabat Teshuvá seja depois e não antes de Rosh Hashaná? Dessa maneira, mesmo depois que o homem atinge as elevadas alturas espirituais de Rosh Hashaná, ainda há necessidade de um Shabat Teshuvá. Pois, quanto mais a pessoa se aproxima de D'us, mais percebe suas falhas no serviço de D'us.
Cada passo à frente significa realmente que o último passo está bem atrás, embora estivesse uma vez "à frente". E enquanto o homem se eleva ainda mais alto, de um plano a outro mais elevado, tem razões para arrepender-se de seu estado anterior, quando estava mais distante de D'us do que está agora.
A Torah é lida neste dia compreendendo a maior parte da parashá Haazinu, a penúltima parashá. Porém, também pode ser o texto da Parashá Vayelech, a porção anterior a Haazinu, por ambas possuírem textos compatíveis com este shabat tão importante.
Nestes textos vemos a exortação de Mashê Rabeinu exortando ao povo para que permaneçam com o Eterno e que se arrependam de o haver deixado em determinados momentos da caminhada.
O que é a teshuvá?
Antes de criar o mundo, Hashem concebeu sete coisas, a saber: Torá, teshuvá, Gan Êden, Guehinam, Kissê Hacavod, Bêt Hamicdash e o nome do Mashiach (Talmud, Massêchet Pessachim 54, 1). Nesta obra abordaremos o conceito de teshuvá.
A teshuvá foi criada antes do Mundo
No Talmud Yerushalmi1 (Macot, capítulo 2, parágrafo 6), há uma passagem, na qual se conta que quatro diferentes personalidades foram consultadas sobre qual deveria ser a ação aplicada à pessoa que pecou. Foram elas: a chochmá (a sabedoria), a nevuá (a profecia), a Torá e, por último, Hacadosh Baruch Hu. As respostas foram diversificadas. Para uma, a pessoa que pecou deveria morrer imediatamente; afinal, quem transgride algo age contra a vontade do Rei (Hashem). Outra respondeu: “O mal deve perseguir constantemente aquele que pecou”. A Torá afirmou: “Que ofereça um corban e será perdoado”. Hashem disse: “Não. Que faça teshuvá e será perdoado”. A chochmá, a nevuá e a Torá não estavam sendo “cruéis” em demasia com o ser humano. Mas é como se dissessem: “Vocês não pecaram contra mim!”. Um exemplo ilustra este impasse: Moshê procura Reuven e diz a ele que está devendo dinheiro para Shim’on, mas quer que ele (Reuven) o perdoe. Reuven responde surpreso: “Mas, como?! Você não está me devendo! Pelo que tenho de perdoar-lhe? Você deve a Shim’on. Sendo assim, vá falar com ele”. Da mesma forma, a sabedoria não pode responder, em nome de Hashem, que o indivíduo está perdoado. A lógica diria que, de fato, a pessoa que pecou deveria ser punida. Entretanto, Hashem, em Sua misericórdia infinita, instituiu o conceito de teshuvá antes mesmo da Criação do Mundo.
A palavra teshuvá significa “retorno” Retorno para onde?
Para responder, recorremos a Shelomô Hamêlech em Cohêlet (7:29): “Levad reê zê matsáti asher assá Haelokim et haadam yashar vehema vikshu chishevonot rabim” (Hashem fez o homem reto. O homem é que encontra vários outros caminhos). Ele (o homem) acha que é mais inteligente que Hashem! Quantas vezes diz: “Ah, agora não vou fazer isso. Deixarei para amanhã”, ou “Não acho que isso deva ser feito”. Com atitude como estas, o homem acaba saindo do caminho, para o qual precisa, em algum momento, voltar. Por isso o conceito se chama teshuvá, retorno. Mas retorno a quê? A seu status original, de indivíduo reto, como Hashem o criou.
A teshuvá de Adam Harishon
A primeira vez em que encontramos o conceito de teshuvá na Torá é em relação a Adam Harishon, depois de ele ter comido do fruto proibido. Mas não devemos classificar Adam Harishon como um homem pecador. Ele foi a única pessoa criada exclusivamente por Hashem. Sua amplitude era extraordinária! Ele falhou no teste de não comer do fruto proibido, mas nós não conseguimos ter nem um pequeno entendimento de sua grandeza espiritual. Além disso, sua intenção ao comer do fruto proibido era das melhores . O Arizal nos diz que estavam vinculadas a Adam Harishon todas as neshamot (almas) das próximas gerações – incluindo, entre elas, tanto tsadikim (justos) quanto reshaim (maus). E, de fato, quem motivou Adam Harishon a comer do fruto proibido não foi só sua esposa, Chavá, mas também todas essas almas que estavam ligadas a ele. Isso inclui não só seus descendentes diretos, mas toda a humanidade! Há uma passagem no Midrash, que se refere ao Livro de Iyov (38:4). Nela, conta-se que, quando Hashem estava mandando todo o sofrimento sobre Iyov, ele interpelou Hacadosh Baruch Hu sobre a razão de estar passando por tantas provas. Hashem respondeu: “Efo hayita beyosdi árets” (Você, por acaso, sabe a que parte do corpo de Adam Harishon estava vinculado4 ?). Iyov disse: “Não, não sei”. Hashem disse a Iyov que somente se ele soubesse a raiz de sua missão, entenderia o motivo de tudo o que estava ocorrendo com ele. Essa é uma das explicações de por que dizemos no Viduy (confissão verbal dos nossos pecados): “Chatánu anáchnu vaavotênu veanshê vetênu” (pecamos nós, nossos pais e nossa família). Precisamos citar pecados que nossos antepassados cometeram no passado devido à influência de nossas próprias almas. Todas essas almas ligadas a Adam Harishon – ele foi o primeiro homem, aquele que deu origem a toda a humanidade – com suas tendências, acabaram impulsionando-o a comer do fruto proibido.
A teshuvá de Cáyin
A segunda vez em que encontramos o conceito de teshuvá na Torá é depois que Cáyin matou seu irmão, Hêvel. O Midrash nos relata que Adam Harishon, o pai, viu Cáyin depois de ele ter sido julgado por Hashem. Ele perguntou ao filho: “Qual foi o veredito?”. Cáyin respondeu: “Fiz teshuvá e Hashem a aceitou”. O Midrash (Bereshit Rabá 22, 13) nos conta que, naquele momento, Adam Harishon começou a bater na própria cabeça com as mãos, dizendo: “Eu não sabia quão grande era a teshuvá!”. Em seguida, começou a dizer o capítulo 92 do Tehilim: “Mizmor shir leyom Hashabat” .
A teshuvá de Reuven
O outro episódio em que encontramos o conceito de teshuvá na Torá é na trajetória de Reuven. Ele era filho de Leá Imênu (uma de nossas matriarcas) e de Yaacov Avínu. Quando Rachel Imênu, a irmã de sua mãe, faleceu, seu pai colocou sua cama na tenda de Bil’há, a ama de Rachel. Ao ver isso, Reuven achou que o pai estava equivocado e transferiu o leito dele para a tenda de sua mãe, Leá. A Torá nos conta que Reuven interferiu na vida particular do pai, cometendo um erro (Bereshit 35:22). O fato é que Yaacov Avínu sabia o que estava fazendo. Ele não tinha quatro mulheres por ser movido à paixão. Ele sabia que tinha a missão de construir, com elas, as doze tribos de Am Yisrael. Ele tinha seus próprios cálculos e não caberia a Reuven, como a nenhum outro filho, interferir na sua vida pessoal7 . Depois disso, houve um momento em que Reuven percebeu seu erro e fez teshuvá. Hashem disse a ele8 (Bereshit Rabá 84, 19): “Nunca ninguém fez teshuvá perante Mim como você. Sendo assim, Eu lhe prometo que um dos seus descendentes também será o pioneiro a clamar por teshuvá na sua época”. Hoshea ben Beeri era descendente de Reuven e viveu na época final do Primeiro Templo. Ele foi o primeiro dos profetas desta época a clamar pela teshuvá do Povo de Israel, e iniciou sua profecia com as palavras (Hoshea 14:2): “Shuva Yisrael ad Hashem Elokecha” (Retorna, Israel, até Hashem teu D´us). E o que significam essas palavras? Elas querem dizer que a teshuvá pode chegar até o trono de Hacadosh Baruch Hu, de modo que quando Reuven fez teshuvá, os anjos disseram a berachá de “Harotsê Bitshuvá” (vide capítulo 6, parágrafo 3) Por que a teshuvá de Reuven foi tão apreciada pelo Criador? O que significa “nunca ninguém fez teshuvá perante Mim como você”? Afinal, Adam Harishon fez teshuvá, assim como Cáyin. A resposta é que todos os que fizeram teshuvá antes dele, reconheceram seus pecados (Adam Harishon comendo do fruto proibido; Cáyin assassinando o irmão). Mas Reuven achava que estava fazendo uma mitsvá ao transferir o leito do pai para a tenda da mãe. Somente depois foi que ele percebeu que não era de fato uma mitsvá, mas sim um erro. Vemos que, às vezes, a pessoa pode achar que está fazendo uma mitsvá, mas na verdade está errando. E é muito mais difícil fazer teshuvá sobre o que se pensa estar certo do que sobre um pecado claramente revelado. De fato, esse tipo de teshuvá é algo maravilhoso. Por isso Hashem louvou a teshuvá de Reuven. Há também algo a mais: Reuven iniciou sua teshuvá antes de ser cobrado ou punido por Hashem, agindo por amor a Hashem.
Até quando se pode fazer teshuvá?
David Hamêlech afirma no Tehilim (90:3): “Tashev enosh ad dacá, vatômer shúvu venê adam” (Fazes o homem tornar ao pó e dizes: ‘Arrependei-vos, ó filhos do homem!’). Os chachamim inferiram deste passuk que o ser humano pode fazer teshuvá até o último momento de sua vida – “Dacá: ad dichduchá denêfesh” – até a agonia da alma. A palavra “dacá” é composta por três letras (dálet, caf e álef). O Chidá (Rabi Chayim Yossef David Azulay zt”l – vide nota de rodapé 48), um dos grandes rabanim das gerações anteriores, diz que “dacá” contém as iniciais de “dam”12 (sangue), que alude a assassinato; “cochavim”13 (estrelas), que remete a idolatria, pessoas que adoram qualquer tipo de imagens, seres ou objetos, e “ishá”14 (mulher), que se refere a adultério, relações proibidas. Isso significa que, mesmo sobre essas três averot (assassinato, idolatria e adultério), consideradas as mais graves da Torá, também é possível fazer teshuvá. Prova disso é o exemplo específico de Cáyin. Ele cometeu um ato terrível ao matar seu irmão, levando Hashem a dizer: “O sangue do seu irmão e dos descendentes dele estão suplicando a Mim da terra, pois você não os deixou vir ao mundo”. Mesmo assim, Cáyin fez teshuvá e Hashem a aceitou.
É interessante e importante salientar que, às vezes, nós não perdoamos os outros. Trata-se de um grande equívoco. Afinal, se Hashem perdoa, nós também temos de perdoar. E Hashem perdoa até mesmo o assassinato, que é um dos pecados mais graves. A proibição do assassinato é o sexto mandamento do Decálogo. Esse mandamento tem seis letras e o homem foi criado no sexto dia da Criação (Báal Haturim, Parashat Yitrô). Nas Tábuas da Lei ele se encontra paralelo ao primeiro mandamento – Eu Sou Hashem que te tirou do Egito. A relação entre esses dois mandamentos é a seguinte: quando alguém mata outro ser humano, é como se estivesse afetando a própria imagem Divina. Ainda assim, se a pessoa cometeu assassinato, ela pode fazer teshuvá. Da mesma forma, também são passíveis de teshuvá avodá zará e arayot, respectivamente, idolatria e todas as relações proibidas pela Torá. Nós, por nossa vez, muitas vezes não aceitamos a teshuvá do outro. Mas temos de aprender a seguir os caminhos de Hashem. Se Ele perdoa, também devemos perdoar!
Do livro "Iluminando o Retorno" de Rabi Isac Dichi
Comentário sobre Hilchot Teshuvah de Rambam
Texto de Introdução ao tema teshuvah.